Covid-19, isolamento e distanciamento social e seus impactos na saúde bucal

Vivemos tempos difíceis! Pensávamos que passaria rápido mas não passou e, infelizmente, parece que ainda está longe de passar. Tudo isso trouxe consequências para a nossa vida. Perdemos pessoas que amamos ou estamos com pessoas queridas internadas e, mesmo que ninguém próximo estivesse enfrentando esta doença, é impossível não se colocar no lugar do outro. É impossível não sentir a dor do outro!
Todos os fatos recentes deram origem a graves
ameaças ao nosso bem-estar, causando potenciais efeitos deletérios na saúde
física e mental das pessoas. As respostas psicológicas comuns dos indivíduos à
pandemia do Coronavírus incluíram estresse, ansiedade e depressão, sendo
capazes de influenciar patologias orais e maxilofaciais como DTM (disfunção
temporomandibular) e bruxismo, que podem agravar ainda mais a dor orofacial
(Almeida-Leite et al; 2020).
A tristeza, a ansiedade e o estresse aumentam a
frequência, intensidade e duração dos hábitos parafuncionais, sendo
responsáveis pela hiperatividade dos músculos mastigatórios e sobrecarga da ATM
(articulação temporomandibular), facilitando o aparecimento da disfunção
temporomandibular (DTM). Foi demonstrado que o estresse emocional aumenta a
atividade dos músculos mastigatórios, levando ao apertamento dos dentes e
consequentes alterações circulatórias nos músculos mastigatórios, que podem
causar sintomas de DTM. De Paiva Tosato et al. descobriram que um aumento no
cortisol - hormônio liberado em situações estressantes-, foi concomitante com
maior atividade muscular e gravidade da DTM, com uma correlação positiva entre
atividade eletromiográfica, cortisol salivar, grau de gravidade da disfunção
temporomandibular e atividade muscular. Em meu consultório, tenho recebido
pacientes que apresentaram acentuada limitação de abertura de boca e processos
dolorosos significativos durante a pandemia.
Relacionar é fundamental e, no momento, estamos
privados de encontros tão importantes. Obviamente, o distanciamento e o
isolamento sociais têm consequências seríssimas em nossa condição emocional.
Pacientes com Disfunção Temporomandibular (DTM) viveram duas vezes mais
acontecimentos de vida estressantes indesejáveis nos seis meses anteriores ao
início do que os pacientes controle ( que não tiveram nenhum contra-tempo),
contribuindo para o início da DTM em quase 50% dos casos (Speculand et al;
1984). As experiências indesejáveis são problemas relacionados ao trabalho,
dinheiro, saúde e outros (por exemplo, luto, dificuldades conjugais, discussões
sérias ou decepções na vida). Esses eventos foram resumidos pelo autor como
“problemas de perda e de relacionamento interpessoal”. Como nos controlar
diante de tudo que estamos vivendo?
Os períodos de distanciamento e isolamento, ou
mesmo o lockdown imposto pela COVID-19 em todos os países afetaram milhões de
pessoas.
Durante esse período, muitas foram obrigadas a
ficar em casa e se isolar socialmente para reduzir a propagação do vírus.
Um estudo preliminar recente mostra que o surto
de coronavírus está associado a um impacto psicológico moderado a grave na
maioria dos indivíduos. Quase
51,4% dos sujeitos que relataram piora dos sintomas de disfunção
temporomandibular relacionaram essa condição ao lockdown imposto pelo
coronavírus e ao estresse vivenciado no período. Esses indivíduos parecem ser
acometidos por maiores sintomas depressivos, maior estresse e maiores sintomas
dolorosos (Saccomanno et al, 2020).
E aqueles que já tinham disfunção
temporomandibular, como estão durante a pandemia? Esses pacientes apresentaram aumento da intensidade da dor facial
crônica. Nós, dentistas, que
tratamos pessoas com DTM devemos considerar essas conclusões preliminares, mas
devemos observar e fornecer maior apoio e cuidado a esses pacientes durante a
pandemia de COVID-19 ou outros eventos estressantes (Asquini et al; 2021).
É preciso uma maior compreensão do papel do
estresse psicológico como possível amplificador da DTM e da dor crônica e à
incapacidade relacionada à dor em pessoas com DTM. Vamos ficar atentos aos nossos pacientes e ouvir,
sempre, suas demandas e queixas. Mais empatia!
Leitura
sugerida
Almeida-Leite,
C.M.; Barbosa, J.S.; Conti, P.C.R. How psychosocial and economic impacts of
COVID-19 pandemic can interfere on bruxism and temporomandibular disorders? J.
Appl. Oral Sci. 2020, 28, e20200263. [CrossRef]
Asquini
G, Bianchi AE, Borromeo G, Locatelli M, Falla D. The impact of Covid-19-related
distress on general health, oral behaviour, psychosocial features, disability
and pain intensity in a cohort of Italian patients with temporomandibular
disorders. PLoS One. 2021 Feb 2;16(2):e0245999. doi:
10.1371/journal.pone.0245999. PMID: 33529226; PMCID: PMC7853459.
Tosato,
J.D.P.; Caria, P.H.F.; Gomes, C.A.F.D.P.; Berzin, F.; Politti, F.; Gonzalez,
T.D.O.; Biasotto-Gonzalez, D.A. Correlation of stress and muscle activity of
patients with di↵erent
degrees of temporomandibular disorder. J. Phys. Ther. Sci. 2015, 27, 1227–1231.
[CrossRef]
Speculand,
B.; Hughes, A.O.; Goss, A.N. Role of recent stressful life events experience in
the onset of TMJ dysfunction pain. Community Dent. Oral
Epidemiol. 1984, 12, 197–202. [CrossRef]
Saccomanno
S, Bernabei M, Scoppa F, Pirino A, Mastrapasqua R, Visco MA. Coronavirus
Lockdown as a Major Life Stressor: Does It Affect TMD Symptoms? Int J Environ
Res Public Health. 2020 Nov 30;17(23):8907. doi: 10.3390/ijerph17238907. PMID:
33266130; PMCID: PMC7731003.